A Terceira Idade

Entrevista ao Sr. Eng.º Duarte Gonçalves, proprietário de um lar

1. Há quanto tempo está aberta a instituição?
Sr. Eng.º: É muito novinha. O primeiro utente entrou a 1 de Julho do ano passado (2008).

2. Qual a capacidade e taxa de ocupação?
Sr. Eng.º: É um número muito reduzido em termos de exploração, de funcionamento e equilíbrio económico.
Temos uma capacidade para 23 pessoas e actualmente estamos apenas com 10 vagas preenchidas, e o aconselhável é por volta de 40 utentes.
Em termos legais há o limite de 60 a 80 utentes por instituição, mas números estatísticos, e até mesmo a prática, referem que o aconselhável é cerca de 40, considerado número de equilíbrio entre a exploração, nível económico, e uma boa prestação de cuidados pelos técnicos.

3. Quais os serviços oferecidos?
Sr. Eng.º: Animação sociocultural, enfermagem diária e em dois turnos (manhã/noite), consulta médica bissemanal, tratamento de roupa (excepto roupa de uso exterior), fisioterapia, e tudo o que seja tratamento das receitas, protocolos, acompanhamento às consultas, encaminhamento aos hospitais em casos de emergência.

4. Quais os problemas mais graves com que a instituição se deparou à chegada de idosos?
Sr. Eng.º: Principalmente a idade já avançada dos utentes, de uma maneira geral, relacionada com a degradação de algumas capacidades fruto de algumas situações.

5. O Estado garante algum tipo de ajuda?
Sr. Eng.º: Garante... E o próprio Estado tem a sua rede de lares de segurança social e de apoio às IPSS, havendo mesmo excelentes instalações apoiadas por este, pelo que não podemos ficar com a ideia que tudo o que o Estado apoia nesta área é fraco - há excelentes instalações e que são efectivamente apoiadas. No nosso caso não tivemos qualquer apoio.

6. Quais as razões que levaram a Cooperativa Colmeia a abrir o centro Colmeia dos Mestres?
Sr. Eng.º: O principal facto é sermos uma cooperativa, pelas mesmas razões porque abrimos a Colmeia das Abelhinhas (colégio). Por definição uma cooperativa não tem intenções de lucro - não quer dizer que não tenha resultados, porque aqui o lucro é apenas por uma questão técnica, pois entende-se que lucro são os rendimentos a ser distribuídos pelos sócios e accionistas e numa cooperativa não há essa distribuição de rendimentos. As cooperativas têm por natureza um papel social e aqui a ideia foi alargar este capital, este serviço, às diferenças faixas etárias, desde as crianças até aos idosos, disponibilizando meios e apoios, que tanta falta fazem, à comunidade em geral.

7. Acha que Portugal em termos de instituições privadas está preparado para o envelhecimento da população?
Sr. Eng.º: Eu acho que não é só Portugal. A questão do envelhecimento é também uma questão económica. Mesmo que queiramos fugir a esse tema, o impacto acaba por ser sempre económico.
Nas instituições privadas podemos dizer que há essencialmente dois grupos: o grupo privado, sim, mas privado-clandestino, e este não vamos considerar, são clandestinos essencialmente porque não obedecem aos requisitos que a segurança social estipula, e são frequentes as notícias sobre este género de instituições; e os privados legais.
A estrutura da sociedade tem-se alterado, em certo ponto tem-se vindo a degradar. Antigamente uma pessoa chegava à velhice e contava com a família, muito porque a mulher não trabalhava e era essencialmente dona de casa, dando apoio e atenção ao idoso, e isso assegurava esse apoio familiar. A partir do momento em que essa estrutura se altera, e em particular com a entrada da mulher no mercado de trabalho, não há mais esta continuidade, é preciso arranjar alternativas, quem faça esse serviço. Por outro lado, as doenças são cada vez mais assistidas e é preciso arranjar pessoal especializado, não é o filho ou a filha curiosa que presta essa assistência aos pais. Mas também sabemos as limitações e quanto custa hoje ter um idoso num lar, mesmo os que são apoiados pelo Estado, e obviamente que as famílias se sentem na necessidade de encontrar um equilíbrio entre a qualidade/custo e por isso vai havendo a oportunidade para esses ditos lares clandestinos e para outros que trabalham com bastante eficácia e profissionalismo e que se nota que gostam do que fazem, não têm apenas o lar como uma fonte de rendimento.
Depois temos o outro nível, o nível dos grandes grupos económicos que oferecem verdadeiros hotéis de luxo para os idosos, mas que apenas uma percentagem muito reduzida da população consegue aceder.

8. Acha que as famílias têm um papel importante depois da chegada dos idosos à instituição? E cumprem essa função?
Sr. Eng.º: O papel das famílias é determinante porque, por muito que nós queiramos evitar, há a nítida sensação de isolamento e até de parcial abandono. O “caminhar” para um lar não é um caminhar voluntário, mas sim um caminhar forçado pelas circunstâncias – ou das famílias não podem acompanhar, ou as condições da pessoa forçam a necessidade de apoio. Ora, não podendo ser as famílias a dar esse apoio, forçosamente têm de ser os lares, mas, naturalmente, os idosos esperam e aguentam até à última para se transferir para um. Esperam até à última que a família continue a prestar o apoio necessário, de uma maneira geral.
Portanto, há sempre aqui a ida para o lar como uma ruptura com a sua relação familiar, uma ruptura com o seu histórico, uma ruptura com o seu modo de estar na vida. E uma ruptura cria sempre angústias. Assim, se a família se mantiver sempre em contacto permanente, ajuda imenso a equipa e a instituição a manter esse equilíbrio emocional por parte do idoso.


9. Tem algum relacionamento com outras instituições?
Sr. Eng.º: Nós, como somos sócios da Associação de Lares de Idosos, vamos mantendo o contacto com outras entidades que também desenvolvem este apoio à terceira idade. Contudo, estamos neste ramo de actividade há cerca de apenas um ano e estamos ainda a começar o nosso percurso.

10. Quais considera os programa que estão a ganhar mais destaque no panorama nacional, como as Universidades de Terceira Idade?
Sr. Eng.º: Eu respondo dando a minha opinião também sobre outras coisas: os idosos não são desperdício – e em particular penso que os países pobres ou em vias de desenvolvimento, como o nosso, que assumem um papel de perdulário (não se pode dizer o mesmo dos ricos porque os países ricos não se dão ao luxo de perder os seus bens) desperdiçam o contributo que as pessoas com uma experiência de vida tão alargada têm para dar. Não digo que pessoas acima dos 80 anos, embora tenhamos visto aqui no lar algumas perfeitamente aptas para dar o seu contributo, mas pessoas entre os 65 e os 75 anos têm grandes contributos ainda para dar. E digo contributos em vários aspectos, até pela riqueza da experiência, porque a experiência é algo que não se consegue absorver em nenhum livro: ou se viveu, ou não se viveu – e eu acho extraordinário que não só as pessoas continuem a ter vontade de aprender e de viver como sejam, também, proporcionados meios para que exista esta actividade, que exista o nível do voluntariado, que exista estas relações de terceira idade com a infância. Acho fantástico aproveitar, como acho terrível desperdiçar.

Aquela imagem triste que nós temos e que associamos muitas vezes do idoso ao banco de jardim e a umas cartas é realmente muito redutora para aquilo que pode acontecer em termos ainda da prestação dos idosos: não é trabalho activo, não é força laboral, mas é pelo menos colocar, pela experiência que têm… de certeza que haveria ainda muitas actividades que pudessem ser desenvolvidas.


11. Portanto aquela imagem que se vê de um idoso num banco de jardim ou numa mesa a jogar às cartas com outras pessoas é uma espécie de fuga à solidão? Acha que poderia ser ocupado de outra maneira o seu tempo livre?
Sr. Eng.º: Acho. Não desdenho as partidas de cartas ou a conversa no jardim, não é isso. Agora, não pode ser a única alternativa, não podem ser tardes seguidas, dias seguidos em que a única ocupação que têm é encontrar-se com os amigos para fazer estes programas. Claro que o “grátis” é extremamente económico: há amigos, sol, mesa no jardim, as cartas duram muito tempo – mas volto a dizer que é redutor não haver outras actividades, cria-se uma certa monotonia. Eu sou da opinião que os idosos ainda têm muito para dar, mas enfim… hoje quando se chega as 40/45anos já se é velho para trabalhar, quando se chega aos 65 anos já se é velho até para ser membro da sociedade. E não é uma questão de ser pena, eu acho que é mesmo uma perda.